Julgamento sobre desentendimento entre deputados gera debate sobre alcance da imunidade parlamentar

Porto Velho, Rondônia -
Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) começaram a debater nesta terça-feira se configura crime contra a honra um parlamentar classificar um adversário político como "nazista" ou fascista". A discussão foi levantada pelo ministro Flávio Dino, que considera que a acusação faz parte do debate político e não pode ser considerada uma ofensa.

A discussão ocorreu na Primeira Turma do STF, durante a análise de uma queixa-crime apresentada pelo deputado federal Gustavo Gayer (PL-GO) contra o também deputado José Nelto (PP-GO). Em entrevista a um podcast, no ano passado, Nelto chamou o colega de Câmara de "nazista", "fascista" e "idiota", além de afirmar que ele se dirigiu a Brasília para "bater numa enfermeira". Entretanto, o julgamento foi interrompido por um pedido de vista e ainda não há uma definição.

A relatora do caso é a ministra Cármen Lúcia, que votou para receber a queixa pelos crimes de calúnia e injúria. Em seguida, Flávio Dino abriu uma divergência parcial: aceitar a acusação apenas por calúnia, devido à declaração sobre agressão a uma enfermeira. Já a menção ao fascismo e ao nazismo estaria protegida pela imunidade parlamentar.

— Eu considero que a palavra nazista, fascista, não possui o caráter de ofensa pessoal ao ponto de caracterizar calúnia, injúria, difamação. É uma corrente política estruturada, na sociedade, no planeta — declarou Dino.

O ministro considera que o mesmo se aplica a outras classificações, como a de "extremista" ou de "comunista":

— Nazista, fascista, extrema-direita, extremista, é da ditadura, apoiou a ditadura militar, não apoiou, defende a democracia, defende o comunismo, é a favor do Muro de Berlim, essas coisas todas, que são ditas há décadas, fazem parte, infelizmente, de um certo debate político, entre aspas, normal. Mas dizer que alguém matou, agrediu outrem a meu ver não se encontra, a princípio, acobertado pela imunidade.

Após a manifestação, Cármen justificou que pode concordar com o colega na análise do mérito do caso, mas que considera que essas imputações são suficientes para receber a denúncia, quando são exigidos apenas indícios mínimos. Isso ocorre, para a ministra, porque o termo nazista tem uma "carga histórica".

— Quando se fala que o fulano, especialmente, é nazista, com a carga histórica do que representou, na Segunda Guerra Mundial, naquela fase toda, isso vem com uma carga que traz também uma série de comportamentos atribuíveis.

Cármen demonstrou a preocupação de que, caso o STF considere que falas como essas não justificam nem mesmo o recebimento de uma denúncia, isso pode funcionar como um sinal de liberação dessas declarações, o que teria impacto inclusive em questões eleitorais.

— Estou apenas tentando, neste momento inicial de recebimento da queixa, verificando que se eu retiro isso, porque não é nem considerado injúria, isto vai ser eventualmente praticado em um ambiente eleitoral com consequências — afirmou, acrescentando: — Neste cenário, não me pareceu que, no primeiro momento, já de pronto, pudesse ser considerado algo regular, legítimo e que não caracteriza qualquer ilícito.

Em seguida, o ministro Alexandre de Moraes pediu vista, para analisar melhor os fatos, e o julgamento foi interrompido.


Fonte: O GLOBO